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sexta-feira, 29 de março de 2024

CRISE NA REPÚBLICA - O SEGUNDO TRIUNVIRATO - A TERCEIRA GUERRA CIVIL NA REPÚBLICA

 




O Segundo Triunvirato foi uma associação política de conveniência entre três poderosas figuras de Roma: Marco Antônio, Lépido e Otávio, no século I a.C.. Após o assassinato de Júlio César, os três juraram vingança contra os assassinos, ao mesmo tempo que tentavam estabilizar uma República Romana em seus estertores. Entretanto, logo haveria uma disputa de egos, eles se encontrariam no campo de batalha e, como resultado, surgiria um imperador.

A Morte de Júlio César

Júlio César estava morto. Nos Idos de Março de 44 a.C., o ditador perpétuo encontrou seu destino. Ele tinha gradualmente despertado o medo em muitos dentro e fora do Senado romano e mesmo alguns dos seus amigos logo se tornaram inimigos mortais. Os descontentes acreditavam que não teriam mais influência política, pois Roma estaria rapidamente caindo sob o controle de um aspirante a tirano. Com a morte de César, sobreveio o caos na República e das cinzas surgiram três homens para formar uma união singular - um Segundo Triunvirato - com o principal objetivo de salvaguardar o governo.

A conspiração para matar Júlio César foi um esquema bem concebido. Os assassinos acreditavam que sua morte ressuscitaria o velho espírito romano e a fé na República seria restaurada. Infelizmente, ainda que o complô tenha sido bem planejado, não havia uma estratégia precisa sobre o que fazer a seguir. Um dos principais conspiradores, Marco Júnio Bruto (ele é o célebre "Et tu, Brute" da peça de William Shakespeare), correu do Teatro de Pompeu, onde o Senado se reunia, até o Templo de Júpiter, na Colina Capitolina, para falar a uma multidão furiosa de cidadãos. Em vez de uma recepção calorosa, deparou-se com a hostilidade do povo e, a despeito dos apelos do Senado por um acordo e anistia - proposta apoiada por Marco Antônio -, os conspiradores foram obrigados sem demora a fugir da cidade. Dois dos assassinos, Bruto e Cássio (acredita-se que este último tenha concebido o plano), escaparam para o leste.

O novo triunvirato foi, para dizer o mínimo, uma coalizão instável. Marco Antônio, Marco Emílio Lépido e, finalmente, o sobrinho-neto de e filho adotado de César, Caio Júlio César Otaviano, eram todos homens proeminentes e de forte personalidade. Ainda que Marco Antônio e Otaviano optassem por deixar de lado suas diferenças, tinham muitas razões para a desconfiança mútua, após travarem várias campanhas militares um contra o outro na Itália setentrional. Cada um acreditava ser o único herdeiro legítimo capaz de liderar o governo após o assassinato de César. Antônio alimentou a discórdia ao bloquear o acesso de Otaviano ao dinheiro de seu pai adotivo. Além disso, Lépido, o terceiro e menos influente do trio, foi nomeado Alto Sacerdote por Antônio, embora este cargo estivesse prometido a Otaviano. O Senado via Antônio como um tirano ainda mais perigoso e as contínuas tentativas de assumir o controle do governo após a morte de César provocaram a ira dos senadores, que o declararam inimigo público. Lépido também foi declarado inimigo público pelo Senado por seu apoio declarado a Antônio.

O comportamento de Antônio irritava muitos cidadãos romanos influentes. Marco Túlio Cícero, estadista romano e poeta, escreveu vários discursos contundentes contra o general. Falando ao Senado, Cícero afirmou:

"Agora ouçam, eu imploro a vocês, Senadores, não quero mencionar aqui os escândalos pessoais e domésticos criados pelas desagradáveis impropriedades de Antônio, mas sim ao modo maléfico, ímpio pelo qual ele tem prejudicado a todos, nossas fortunas e nosso país inteiro."

Por mais estranho que pareça, o trio logo forjaria uma aliança singular e, apesar da discórdia existente, estavam unidos no desejo de vingar a morte de César. Porém, a despeito de seus melhores esforços (ou por causa deles), no final das contas a República iria ser mergulhada em duas décadas de guerra civil - algo que muitos acreditavam que César havia previsto.

Apesar de sua juventude, Otaviano, aos 19 anos, tinha o apoio de uma parte significativa do exército, especialmente das legiões leais a César. Em 43 a.C., ele postou-se nas imediações de Roma com seu exército e exigiu que o Senado lhe concedesse a autoridade política que necessitava, ou seja, o consulado. Naturalmente, estava muito abaixo da idade mínima requerida de 33 anos (que já havia sido recentemente reduzida da requisitada anteriormente, de 43 anos). Os soldados leais a Otaviano entraram no Senado com espadas na mão; o Senado prudentemente revisou uma decisão anterior e conferiu-lhe o consulado, junto com seu primo Quinto Pédio como co-cônsul. Imediatamente a Lex Pedia foi aprovada - um decreto que revertia uma decisão anterior que garantia imunidade aos conspiradores. Esta nova lei estabelecia um tribunal especial que, sem demora, condenou todos os envolvidos na morte de César, incluindo Sexto Pompeu, que sequer participara do assassinato.

O Triunvirato é formado

Em Outubro de 43 a.C., Lépido e Antônio encontraram-se com Otaviano próximo a Bonônia para formar um triunvirato - uma Comissão Constitucional - com poderes similares ao consulado. Sem alterar o funcionamento diário do governo, o propósito único da comissão era restaurar a estabilidade da República. Esta nova autoridade lhes permitia decretar leis sem a prévia aprovação do Senado. O triunvirato foi formalmente reconhecido pelos senadores através da Lex Titia em Novembro de 43 a.C., conferindo ao trio a suprema autoridade por cinco anos (até 1° de Janeiro de 37 a.C.) e designando-lhes a importante tarefa de caçar os assassinos, especialmente Bruto e Cássio. No que se refere aos conspiradores, os triúnviros não tinham intenção de ser clementes e um decreto foi promulgado com a condenação de 300 senadores e mais de 2.000 cavaleiros romanos, a classe dos equites. Os executores saíram a campo. Muitos dos que integravam a lista de inimigos decidiram fugir da cidade, abandonando todas as suas propriedades. A venda do que foi confiscado financiou a caçada.

Embora não diretamente envolvido no assassinato de César, um dos nomes relacionados para a execução foi o de Cícero. Acredita-se que Otaviano tenha tentado manter seu nome fora da lista, mas seus discursos (as Filípicas, contra Marco Antônio) não lhe granjearam nenhuma boa vontade. Cícero sempre vivera pelo seu código pessoal - o maior bem estava em servir ao estado e se opor a qualquer um que o ameaçasse. Ele acreditava firmemente que Antônio era um inimigo do estado e deveria ter sido morto junto com César. Antônio jamais fora conhecido pela capacidade de perdoar, especialmente no que se referia à sinceridade de Cícero. O senador tornou-se uma das primeiras vítimas do triunvirato. Foi flagrado tentando fugir de sua villa nos arredores de Nápoles. Suas mãos, que haviam escrito os discursos pejorativos, foram cortadas como um símbolo, enquanto sua cabeça acabou pregada na plataforma dos oradores do Fórum. Além de Cícero, outro conspirador influente a morrer foi Décimo, que não conseguiu se juntar a Bruto na Macedônia. Décimo havia convencido o adoentado César a comparecer ao Templo de Pompeu, onde seria assassinado. Após ser capturado na Gália e decapitado, sua cabeça foi enviada a Antônio.

Com a eliminação de vários integrantes da lista de inimigos, o trio voltou suas atenções para Bruto, Cássio e Sexto Pompeu. Em Junho de 42 a.C., Bruto e Cássio se encontraram em Sardis, na Anatólia Ocidental. Com Lépido na Sicília, Otaviano e Antônio cruzaram o Mar Adriático e enfrentaram os dois conspiradores na Batalha de Filipos, na Macedônia oriental. Otaviano caiu doente, mas Antônio venceu com facilidade; Cássio, temendo uma captura, pediu para ser decapitado e Bruto o sepultou em segredo. Ele escapou somente para, mais tarde, cometer suicídio. Sexto Pompeu, filho do lendário general Pompeu, o Grande, considerado fora da lei devido à Lex Pedia, escapou para a Sicília e com o tempo firmou um pacto com o triunvirato. Mais tarde, Otaviano reconsiderou o acordo, na crença de que Pompeu o tinha traído, e o jovem comandante foi capturado e executado sob suas ordens.

Embora a maioria dos relatos sobre a batalha de Filipos traga Otaviano doente e sem se envolver na luta, o historiador romano Suetônio, em sua obra Os Doze Césares, conta uma versão diferente.

Como um membro do triunvirato que consistia em Antônio, Lépido e ele mesmo, Augusto [Otaviano] derrotou Bruto e Cássio em Filipos, embora estivesse com a saúde prejudicada. Na primeira das duas batalhas, ele foi expulso de seu acampamento e escapou... Após o segundo e decisivo combate, ele não mostrou clemência aos inimigos derrotados...

De acordo com a versão de Suetônio, a cabeça de Bruto foi enviada a Roma e atirada aos pés da “divina imagem de César”.

O Triunvirato é rompido

A despeito das sucessivas vitórias no leste, os dias do triunvirato estavam contados. Em 37 a.C., Lépido foi excluído da renovação da coalizão. Apesar de seu apoio na luta contra Pompeu, os contínuos fracassos militares levaram Otaviano a exilá-lo em Circei no ano seguinte. Suetônio relata:

Lépido, o terceiro membro do triunvirato, a quem Augusto havia convocado da África para apoiá-lo, imaginou-se tão importante, como o comandante de vinte legiões, que... violentamente exigiu o posto mais alto do governo. Augusto retirou Lépido do comando das legiões e, após implorar para ter a vida poupada, o ex-triúnviro passou o restante de seus dias no exílio permanente em Circei.

Com isso, o império passou a ser dividido igualmente entre Otaviano e Antônio, que ficaram com o oeste e o leste, respectivamente. Esta divisão acabaria por apressar o fim da parceria. Antônio encontrou-se com Cleópatra VII do Egito, a antiga amante de César; seu relacionamento amoroso conduziria à guerra.

Como já havia ocorrido com os membros sobreviventes do primeiro triunvirato (Júlio César e Pompeu), Antônio e Otaviano, com o tempo, reacenderiam sua antipatia mútua. Muito deste descontentamento centrava-se em Cleópatra. Após a morte da esposa de Antônio, Fúlvia, ele se casara com a irmã de Otaviano, Otávia. Agora, suas atenções afastavam-se de Otávia e concentravam-se na rainha egípcia. Ele acreditava que o dinheiro dela ajudaria a financiar a guerra contra Otaviano. Depois, Alexandria seria a nova capital, substituindo Roma. Otaviano jamais tivera muito afeto por Cleópatra, principalmente devido ao relacionamento com César e o nascimento do filho de ambos, Cesarion. Para ele, Antônio tinha se tornado incompetente e doente de amor, o que o fazia questionar a influência da rainha sobre ele. Portanto, em vez de uma guerra contra seu colega, Otaviano fez o Senado declarar guerra a Cleópatra.

Batalha de Ácio

Em 31 a.C., os dois lados finalmente mediram forças. O plano de Antônio era montar uma armadilha para Otaviano e sua frota em Ácio, no Golfo da Ambrácia, na costa ocidental da Grécia. Havia falhas sérias neste planejamento. À parte o fato de que Antônio não era um comandante naval competente, muitos de seus oficiais estavam descontentes com a presença de Cleópatra e suas opiniões nas reuniões do conselho. Isso contrariava as crenças romanas referentes ao papel feminino na política (as mulheres eram reconhecidas como cidadãs em Roma, mas não tinham permissão de participar de assuntos governamentais). Explorando estas convicções, Otaviano empregou táticas de propaganda para alienar o staff do adversário, questionando a influência da rainha na tomada de decisões do general. Ele parecia indeciso e o moral caiu muito, enquanto as deserções aumentavam.

A despeito de superar numericamente as forças de Otaviano, o plano de Antônio falhou completamente. Ele e Cleópatra ficaram presos, havia poucos suprimentos e o inverno estava chegando. Escapando por milagre, Antônio dirigiu-se à Líbia e Cleópatra ao Egito. Sua esperança residia em alistar mais tropas, mas, assim como seus planos anteriores, este também fracassou. O suicídio era o único recurso para Antônio e, após uma infrutífera tentativa de alcançar um acordo com Otaviano, Cleópatra também tirou a própria vida. Otaviano retornaria a Roma como um herói. O Senado recompensou-o com um título e nome novos: Augusto, o primeiro imperador do novo Império Romano. Assumindo com o tempo uma autoridade muito além da prevista pelo Senado, Augusto prepararia o terreno para os imperadores que o sucederiam nos séculos seguintes.

 

CRISE NA REPÚBLICA - O PRIMEIRO TRIUNVIRATO - A SEGUNDA GUERRA CIVIL NA REPÚBLICA

 



O Primeiro Triunvirato da Roma antiga foi uma aliança instável entre os três titãs - Júlio César, Pompeu e Crasso - que, de 60 a.C. até 53 a.C., dominou a política da República Romana. Alianças têm sido sempre uma parte da história. A união de Esparta e Atenas contra os Persas, no 5° século a.C. ou as forças aliadas da Tríplice Entente na Primeira Guerra Mundial mostram que nações e indivíduos - mesmo ex-inimigos - têm buscado assistência mútua por uma razão ou outra a fim de superar um adversário comum. A Roma antiga não era diferente. Uma República instável, à beira da guerra civil, levou trio a colocar de lado suas diferenças e até mesmo o desprezo de um sobre o outro para juntar forças e dominar o governo de Roma, inclusive controlando eleições, por quase uma década. Um deles iria eventualmente elevar-se acima dos demais e se tornar ditador. Seu nome era Caio Júlio César. Contudo, isso estava a vários anos adiante. No momento, ele participava do que os historiadores modernos vieram a chamar de Primeiro Triunvirato.

A República enfrentava dificuldades. O caos reinava na ordem política romana. Havia violência nas ruas e distúrbios civis. Para alguns, a cidadania romana estava em declínio, vítima da decadência moral. O estadista, filósofo e poeta Marco Túlio Cícero havia inclusive exposto uma conspiração liderada por um proeminente senador, Lúcio Sérgio Catilina, para derrubar a liderança romana. Muitos acreditavam que era apenas uma questão de tempo antes que a República caísse. Porém, três homens, frequentemente referidos como uma "Gangue de Três", aproveitou a oportunidade de ganho pessoal, formando uma aliança ou triunvirato que iria eventualmente transformar o governo. A despeito de diferenças individuais e pura animosidade, este "monstro de três cabeças" iria permanecer no controle, inclusive através de subornos e ameaças, para dominar tanto o consulado quanto os comandos militares.

Os Membros do Triunvirato

Os três homens que iriam alterar a face da política romana eram Cneu Pompeu Magno (Pompeu), Marco Licínio Crasso e Caio Júlio César. Cada um tinha suas próprias razões para a atuação em conjunto, percebendo que não poderiam atingir seus objetivos sozinhos. Tinham conquistado sucesso pessoal, mas queriam mais gloria e dignitas (glória e dignidade). Portanto, em 60 a.C. o trio uniu seus recursos, colocou de lado suas diferenças (Crasso, ainda que um dos homens mais ricos de Roma, desprezava Pompeu) e se apoderaram do controle do estado; porém, a despeito das boas intenções e realizações pessoais, a união era tênue, para dizer o mínimo.

Embora se considerasse um amigo tanto de César quanto de Pompeu, Cícero, que desgostava dos optimates (senadores romanos), num sentimento mútuo, não foi convidado para se juntar ao grupo, ainda que eles respeitassem suas habilidades oratórias e fizessem uso regular de seus serviços como advogado. Ele ainda acalentava os velhos valores aristocráticos dos patrícios (mesmo que muitos deles não o respeitassem). Infelizmente para o famoso orador, as consequências da descoberta da conspiração de Catilina e a oposição aos conservadores levaram-no ao exílio. Seria preciso recorrer a Pompeu e César para que fosse permitido seu retorno a Roma, em 57 a.C..

Com o tempo, as diferenças entre os membros da aliança e sua própria ganância pessoal iriam conduzir à ruína do triunvirato. No momento, porém, a "gangue" viu uma oportunidade e a aproveitou, mas a iniciativa não surgiu da noite para o dia. Os primórdios da aliança datavam da década anterior.

Crasso

Em 73 a.C., um trácio chamado Espártaco liderou uma revolta numa escola de gladiadores em Cápua, cidade situada ao sul de Roma. Ele e seus seguidores espalharam o tumulto através da Itália. A rebelião durou quase dois anos, desafiando as forças romanas enviadas para enfrentá-los. O Senado Romano então enviou Crasso, em 71 a.C., para dar um fim à insurreição. Espártaco terminou morto e 6.000 de seus seguidores foram crucificados ao longo da Via Ápia - a estrada entre Roma e Cápua - para servir como um aviso a outros escravos. Mesmo que a maior parte dos louvores devesse ser creditado à liderança militar de Crasso, Pompeu, que chegava da Espanha com seu exército, tentou roubar a maior parte do crédito, ainda que tenha se limitado a eliminar os remanescentes do exército de Espártaco. Em seguida, ambos desobedeceram ao Senado e se recusaram a desmobilizar seus soldados. Pompeu, na verdade, desprezava o governo republicano, mas a derrota de Espártaco e seus seguidores garantiu que ambos fossem eleitos co-cônsules em 70 a.C.. Crasso nunca esqueceu a arrogância do colega de consulado e sempre buscou um comando militar no qual ele, sozinho, pudesse alcançar a glória.

Pompeu

Problemas no Oriente - a pirataria, por exemplo - provocaram uma carência de alimentos em Roma. Em 67 a.C., Pompeu foi enviado ao leste para não somente suprimir a presença de piratas, mas também para confrontar o Rei Mitridates do Ponto, que representava uma perigosa ameaça para o poder romano na Ásia Menor ao atacar continuamente as províncias da região. Sua morte levaria um de seus herdeiros ao poder e à paz com Roma. De 66 a 63 a.C., Pompeu e seus homens marcharam do Cáucaso até o Mar Vermelho, redesenhando o mapa político do Mediterrâneo oriental. Ele reorganizou as províncias em estados clientes de Roma, retornando à cidade em 62 a.C. como um herói. Porém, ao chegar, ele entrou na cidade como um cidadão, não um soldado, uma vez que havia desmobilizado seu exército. Tinha uma nova agenda: terra para seus veteranos e a colonização do oriente. Havia certa lógica na proposta: ninguém queria veteranos desempregados na cidade, e instalá-los no leste iria reduzir as tensões na região; no entanto, era uma iniciativa que o Senado jamais iria aprovar. Entre os opositores estava Márcio Pórcio, mais conhecido como Catão, o Jovem, líder dos optimates, o grupo conservador do Senado.

César

No trio, dois tinham razões válidas para se unir: Pompeu queria a recompensa para seus veteranos por sua bravura no leste, enquanto Crasso esperava não somente aumentar sua reputação num comando militar, mas também recuperar o dinheiro que ele e outros investidores haviam perdido durante as crises no suprimento de alimentos no Oriente. O terceiro membro da "gangue", Júlio César, um herói militar por direito, retornou da Espanha em triunfo, que ele tinha esperança de trazer-lhe fama e riqueza adicionais. Apesar de não ser tão próspero quanto os outros (na verdade, estava afundado em dívidas) ele, também, tinha uma meta - ser eleito cônsul e após seu mandato obter um proconsulado e o comando militar na Gália.

Os Três Juntam Forças

Para alcançar metas tão difíceis, o trio percebeu que o apoio mútuo era essencial. Assim, reuniram seus recursos pessoais (principalmente o dinheiro de Crasso), contatos (Cícero) e, principalmente, ambição para colocar seus planos em ação. A primeira prioridade: César conseguiu reconciliar as diferenças entre Pompeu e Crasso. A seguir, sua filha Júlia casou-se com Pompeu, para selar a aliança. Juntos, a "gangue" superou seu primeiro obstáculo quando César foi eleito co-cônsul para o ano de 59 a.C., junto com Marco Calpúrnio Bíbulo, infelizmente um velho amigo de Catão. Em sua obra Os Doze Césares , o historiador romano Suetônio relata que César:

"teve sucesso em reconciliar Pompeu e Marco Crasso - cuja rixa permanecia depois do fracasso em concordar nas questões políticas durante seu consulado. Pompeu, César e Crasso agora formavam um pacto triplo, jurando se opor às leis que não fossem do interesse de qualquer um deles."

A despeito de seus melhores esforços, César foi incapaz de levar adiante a agenda de Pompeu ou qualquer outras reformas através do Senado. Por lei, um cônsul tinha o direito de veto às propostas feitas pelo seu colega, e foi exatamente o que Bíbulo fez. Assim, ao invés tentar lutar no Senado, César levou suas propostas à assembleia popular. No momento em que César apresentou suas propostas à assembleia, Bíbulo tentou interferir, mas foi lançado pelas escadas do Tempo de Castor e coberto de dejetos. Ele voltou para casa, onde permaneceu distante da vida pública pelo restante do seu mandado. César iria governar sozinho. Catão finalmente admitiu a derrota e aceitou a lei; os veteranos conseguiram suas terras. O triunvirato estava aparentemente funcionando.

 

A Morte de Crasso

Após o final de seu mandato como cônsul, César atravessou os Alpes para a Gália com seu exército. Ele passaria os próximos dez anos na região, retornando à Itália em triunfo em 50 a.C.. Pompeu, já sentindo uma pontada de ciúme pelo sucesso de César, ganhou o apoio do Senado e recebeu o controle do fornecimento de grãos para a cidade em 57 a.C., após uma série de tumultos. Em seguida, Pompeu e Crasso novamente foram eleitos cônsules em 55 a.C. Após seu mandato, Pompeu foi escolhido como governador da Espanha, ainda que tivesse permanecido em Roma e governasse a província através de uma série de representantes. Já Crasso conseguiu seu desejo e foi premiado com o comando de um exército, esperando obter fama pessoal no Oriente. Infelizmente, nunca conseguiria realizar seu objetivo. Em 53 a.C., na Batalha de Carras (Carrhae), foi derrotado, morto e decapitado pelos antigos inimigos de Roma, os Partos. Como um insulto adicional, sua cabeça seria usada como um objeto de cena pelo rei numa apresentação de uma peça de Eurípedes, As Bacantes. Sua morte foi um presságio da ruína do triunvirato. A aliança tinha sido renovada em 56 a.C., em Luca (César viajou da Gália para comparecer), mas Crasso era a cola que os mantinha unidos. A divisão entre César e Pompeu aprofundou-se com a morte de Júlia, esposa de Pompeu e filha de César, que faleceu no parto em 54 a.C..

Guerra Civil - César como Ditador

Com 40.000 soldados, César atravessou o Rubicão e retornou a Roma. Mais rico e poderoso, ele desejava um retorno à política, mas encontrou a oposição de Pompeu e dos conservadores para um novo mandato como cônsul. No momento, Pompeu era o favorito do Senado. Tinha inclusive sido nomeado cônsul único em 52 a.C., com total apoio de Catão. Posteriormente, foi agraciado com o comando das forças romanas na Itália. O ódio adormecido por anos entre os dois, além do ciúme de Pompeu pelas conquistas de César, levaram à guerra civil.

Cícero, que se considerava amigo de ambos, preocupava-se com o clima de hostilidade entre os dois líderes. Ele escreveu a César em março de 49 a.C.:

… se está disposto a proteger nosso amigo Pompeu e se reconciliar com ele e o estado, certamente não encontrará ninguém melhor para alcançar este objetivo do que eu. … Tenho sido sempre um advogado da paz. … No momento estou profundamente preocupado com a legítima posição de Pompeu.

Ele acrescentou que considerava a ambos como seus amigos e esperava “…conseguir uma conciliação entre você e Pompeu e a paz para o povo de Roma.” César respondeu que tinha confiança de que Cícero não iria interferir na questão. “Embora eu esteja convencido de que você não iria agir de forma precipitada ou impensada... Em nome de nossa amizade, não deve tomar nenhuma atitude, agora que a situação me é favorável".

Pompeu deixou Roma, com seu exército, em direção à Grécia e foi seguido por César. Em 48 a.C., eles se encontraram na Batalha de Farsália. César venceu. Pompeu fugiu para o Egito, onde foi assassinado e decapitado na praia onde desembarcou por ordens de Ptolomeu XIII. Sua cabeça foi presenteada a César, que desembarcou no Egito logo após o assassinato. Após controlar a situação na Ásia Menor e norte da África, César retornou a Roma, onde atuou como ditador até ser assassinado nos Idos de Março de 44 a.C..

 

 

CRISE NA REPÚBLICA - MÁRIO X SULA - A PRIMEIRA GUERRA CIVIL NA REPÚBLICA




No começo do século I a.C., a República Romana entrou em uma nova fase, de hegemonia, depois de ter destruído a República de Cartago na Terceira Guerra Púnica (147 a.C.) e da conquista do Reino da Macedônia e de partes do Império Selêucida. Apesar desta contínua expansão, o crescimento demográfico e econômico provocou uma crise no modelo estatal que fragmentou a sociedade romana e aumentou enormemente a polarização social. O Senado se dividiu com a ascensão de duas facções: os populares, formada pelos senadores reformistas que queriam expandir a cidadania aos novos súditos de Roma e democratizar as instituições estatais aumentando o poder das assembleias populares, e a dos optimates, que reunia os senadores aristocráticos conservadores que queriam limitar o poder das assembleias populares e aumentar o poder do Senado Romano.

Em 112 a.C., irrompeu a Guerra de Jugurta entre a República Romana e o Reino da Numídia, na qual ficaram evidentes as fragilidades desta nova sociedade romana. Jugurta se manteve no poder subornando abertamente oficiais e funcionários romanos. Mário lutou como oficial na Numídia e ganhou uma certa fama, que utilizou depois em Roma para aumentar suas chances de ser eleito cônsul. Ele criticou de forma populista o general comandante das forças romanas na Numídia, Quinto Cecílio Metelo, acusando-o de prolongar a guerra desnecessariamente apenas para aumentar sua própria glória. Em 107 a.C., Mário foi eleito cônsul e tentou assumir o comando da guerra, mas o Senado se negou a entregar-lhe o comando das tropas, o que levou Mário a proferir violentos discursos contra os optimates e a dar início a um recrutamento de voluntários entre seus próprios clientes e entre as classes mais pobres, que até então estavam impedidas de servir no exército, para formar um exército a frente do qual marchou para a Numídia.

O segundo-em-comando de Mário era Lúcio Cornélio Sula, que foi descrito como um soldado capaz e inteligente, mas cujo posicionamento político era conservador. Os dois derrotaram a Numídia e capturaram Jugurta em 105 a.C.. Sula foi o responsável pelo final da guerra, costurando um acordo com o sogro de Jugurta, Boco I da Mauritânia. Jugurta se rendeu a Sula, o que serviu de pretexto para que os conservadores desprestigiassem os feitos de Mário e alçassem Sula como o paladino da República. Esta humilhação deu origem a inimizade entre os dois.

"Em circunstâncias tão fúteis e pueris se fundamentou o ódio de ambos, que mais tarde levou aos desmandos da guerra civil e depois à tirania e à perversão de todo o Estado.”

                             Plutarco, Vidas Paralelas, Vida de Mário

Apenas um ano depois, Roma teve que enfrentar uma grande invasão de cimbros e teutões, o que aplacou as diferenças entre Sula e Mário. O primeiro permaneceu sob as ordens do segundo nas sucessivas campanhas entre os anos 104 e 103 a.C.. Sula liderou com sucesso uma expedição contra os tectósagos e conseguiu assassinar seu líder, Cepilo. Pouco depois, se destacaria também por negociar um tratado com os mársios e liderou extra-oficialmente o exército do cônsul Quinto Lutácio Cátulo, um dos protegidos de Mário, contra os cimbros que haviam invadido o norte da Itália. Eles foram derrotados na Batalha de Vercelas (100 a.C.), na qual Sula dirigiu pessoalmente a cavalaria romana, revelando não apenas a sua capacidade organizacional, mas também a sua habilidade para o combate. Finalmente, a disputa com Mário explodiu depois da vitória sobre os cimbros, pois Cátulo e Sula reclamaram mais créditos pela vitória em Vercelas do que Mário estava disposto a conceder.

O tempo que Mário esteve fora de Roma (entre 99 e 90 a.C.) foi de relativa paz e o Senado parecia ter a situação sob controle. Apesar disto, em 95 a.C. foi aprovada Lex Licinia Mucia, dirigida contra os aliados italianos que haviam reclamado fraudulentamente a cidadania romana, o que provocou um grande mal-estar em Roma.

Em 92 a.C. foi eleito o tribuno da plebe Marco Lívio Druso, que preparou uma série de medidas controversas, como uma nova lei frumentária e uma desvalorização do sestércio de prata. Ele também estabeleceu uma aliança secreta com os italianos prometendo-lhes a cidadania se eles arcassem com os custos de uma nova distribuição de terras. As ideias de Druso foram rechaçadas oficialmente pelo Senado e ele próprio acabou sendo assassinado, o que provocou uma guerra entre Roma e seus aliados, a Guerra Social.

Entre os adversários de Roma estavam picenos, lucanos, mársios, samnitas e apúlios, aos quais se juntaram ainda etruscos e úmbrios. As tribos aliadas se juntaram em uma confederação independente chamada Italia, com capital em Corfínio, a leste de Roma, onde foi criado um novo Senado e cunhada uma nova moeda. No começo da guerra, os romanos foram sucessivamente derrotados até que, em 90 a.C., o Senado entregou o comando do exército a Sula. A guerra terminou quando Sula aniquilou o exército samnita em Esérnia, mas os derrotados ainda assim conseguiram seu objetivo político, já que três leis foram aprovadas em sequência estendendo a cidadania romana aos povos italianos.

Os eventos que levaram à guerra civil ocorreram longe de Roma, no oriente. Mitrídates VI, um jovem rei do Ponto, embarcou num programa de expansão territorial e tentou, sem sucesso, anexar o Reino da Bitínia e, por conta disto, o procônsul da Ásia, Mânio Aquílio exigiu que o Nicomedes IV, rei da Bitínia, fosse indenizado. Mitrídates respondeu que ele próprio era credor de Roma pois havia subornado vários senadores e não tinha intenção nenhuma de pagar. Foi então que Roma incitou Nicomedes a invadir o Ponto. Mânio Aquílio assumiu o comando dos exércitos romanos da Ásia e da Cilícia e também da frota, que estava em Bizâncio. Mitrídates, por sua vez, reuniu um exército de 300 000 homens, 130 carros de guerra, 300 navios e vários mercenários, como hoplitas gregos, guerreiros citas e cavaleiros armênios. Ele dividiu seu exército em dois, enviando o primeiro para o noroeste para enfrentar Aquílio e os bitínios e o segundo para invadir as províncias romanas da Ásia e da Cilícia. Em 88 a.C., Mitrídates respondeu ao ataque de Nicomedes com um poderoso contra-ataque. Seu comandante, Arquelau, derrotou o exército de Nicomedes na Batalha do Rio Ânias e o exército romano de Aquílio na Batalha do Monte Escorobas. Aquílio acabou traído pela cidade de Mitilene e foi executado, o que provocou a rendição da frota romana no Mar Negro. O Reino do Ponto então anexou a Capadócia, a Bitínia e Ásia. A maioria das pólis gregas da Ásia Menor, parte do antigo Reino de Pérgamo, como Pérgamo, Éfeso e Mileto, receberam Mitrídates como um libertador contra o jugo dos romanos.

De todas as regiões e dentre todos os aliados do mundo grego, somente os rodenses se mantiveram fieis aos romanos, o que fez com que Mitrídates lhes declarasse guerra. Depois de fracassar em sua tentativa de capturar Rodes, Mitrídates escreveu para todas as cidades gregas da Ásia instruindo-as a assassinarem todos os cidadãos romanos na Ásia. Segundo as fontes históricas, cerca de 80 000 pessoas foram executadas num evento que ficou conhecido como "Vésperas asiáticas".

A situação se tornou crítica para Roma, que testemunhava o seu poder no oriente se desmanchando. Diante da situação, o Senado Romano se viu na obrigação de escolher um dos dois cônsules romanos para liderar a reação romana justamente num momento de dura divisão ideológica entre senadores optimates e populares. Os dois líderes das facções, Sula e Mário respectivamente, disputavam a honra. O Senado escolheu Sula, que partiu imediatamente para reassumir o comando de seu exército, que estava cercando Nola, um dos últimos redutos dos rebeldes da Guerra Social. Neste ínterim, Mário ignorou a decisão do Senado e, utilizando sua poderosa influência, convenceu o tribuno da plebe Públio Sulpício Rufo a aprovar uma lei que dava importância maior para os votos dos novos cidadãos romanos italianos enquanto ele próprio transportava uma grande quantidade deles para Roma. Na Assembleia popular, Sulpício apresentou e aprovou uma resolução que entregava o comando da guerra a Mário, o que contrapôs a Assembleia, dominada pelos populares ao Senado, dominado pelos optimates

Primeira Guerra Civil de Sula

Dois generais romanos estavam nomeados para conduzir o exército romano contra Mitrídates e nenhum dos dois podia entrar em ação enquanto a contradição legal não se resolvesse. Sula então tomou uma decisão sem precedentes, colocando em risco não apenas o seu comando, mas também o seu próprio futuro político: marchou com seu exército até Roma. Pela primeira vez na história da República Romana, um general romano avançou contra a capital, um ato que Mário certamente acreditava ser impossível. Com determinação inabalável, Sula, à frente de cinco legiões veteranas, entrou em Roma sem enfrentar resistência e contra os esforços de Mário, que tentou inutilmente montar uma defesa da cidade.

Mário e Sulpício Rufo fugiram de Roma e foram perseguidos pelos homens de Sula. Rufo foi capturado a trinta quilômetros ao sul de Roma e executado; Mário conseguiu chegar até a costa e embarcou para a África, refugiando-se numa pequena ilha perto da antiga costa cartaginesa.

Sula convocou o Senado e exigiu que seus inimigos fossem declarados inimigos do estado. O Senado aceitou, pronunciando-se contra Mário, Sulpicio e mais dez aliados entre os populares. Sula também conseguiu que fosse invalidada a lei aprovada por Sulpício e fossem promulgadas novas leis reafirmando a tradicional supremacia do Senado. Neste conturbado contexto, foram convocadas novas eleições consulares e os optimates, aliados de Sula, não conseguiram nenhuma das duas posições. Os eleitos foram Cneu Otávio, inimigo declarado de Sula, e Lúcio Cornélio Cina. Sula os fez jurar que não revogariam as leis que ele acabara de aprovar e partiu para a Grécia para enfrentar Mitrídates na Primeira Guerra Mitridática.

Em 87 a.C., durante a ausência de Sula, Cina ressuscitou a proposta de concessão do direito ao voto para os novos cidadãos italianos em todas as tribos e propôs a restauração dos poderes da Assembleia da plebe e uma anistia para todos os seus aliados no exílio. Esta afronta, em clara violação ao juramento feito a Sula, provocou o reinício da guerra civil. Otávio, com a ajuda da maioria conservadora do Senado, conseguiu expulsar Cina e seis tribunos da plebe de Roma. Cina foi deposto do cargo e perdeu a cidadania romana, o que o levou a fugir para Nola. Com a ajuda dos italianos derrotados na Guerra Social, ele convocou Mário de volta de seu exílio para inflamar seus fieis veteranos.

Cina subornou uma grande quantidade de soldados romanos e italianos no sul da Itália, a maioria dos quais pertencentes a Ápio Cláudio. Ainda em 87 a.C., Mário, vindo do norte, e Cina, vindo do sul, marcharam até Roma à frente de seus exércitos. A defesa da cidade, organizada por Otávio e Pompeu Estrabão, foi muito atrapalhada pela postura ambígua de Estrabão e por uma epidemia que assolou a cidade por dois meses, o que facilitou a captura pelos populares. Além disto, Mário interceptou o suprimento de trigo da cidade e saqueou Óstia, massacrando a maior parte dos habitantes, o que tornava impossível qualquer resistência prolongada. Cina e Mário entraram em Roma com quatro exércitos, dois dos quais controlados por Quinto Sertório e Cneu Papírio Carbão, que se declararam cônsules.

A idade avançada de Mário, que já tinha mais de setenta anos, não impediu que ele se se entregasse a uma orgia vingativa sobre os que o haviam humilhado. Todos os inimigos que ele pôde encontrar foram assassinados, a maioria membros do Senado, uma perda da qual a instituição jamais se recuperaria. No ano seguinte, Mário e Cina forçaram a eleição deles próprios como cônsules diante de um reduzido e intimidado Sendo, o sétimo mandato de Mário. Porém, apenas dezoito dias depois, Mário faleceu e Cina se viu sozinho no controle de Roma.

Segunda Guerra Civil de Sula

No oriente, Sula capturou Atenas em 86 a.C., enfrentou as tropas pônticas na Batalha de Queroneia e na Batalha de Orcômeno, derrotando sucessivamente as forças de Mitrídates. Neste mesmo ano, Cina enviou um outro exército romano até a Grécia para lutar contra Mitrídates e contra Sula liderado pelo cônsul sufecto Lúcio Valério Flaco e pelo legado Caio Flávio Fímbria. Valério Flaco foi assassinado por dois de seus homens e o comando das forças senatoriais recaiu sobre Fímbria, que cruzou para a Bitínia com a ajuda da cidade de Bizâncio e conquistou algumas cidades por acordo e outras pela força. Fímbria atacou de surpresa o exército pôntico, liderado pelo jovem Mitrídates com o apoio dos generais Taxiles, Diofanto e Menandro e infligiu-lhes uma grande derrota. Depois desta batalha, grande parte das pólis gregas voltaram para o lado dos romanos.

As derrotas pônticas e a instabilidade política em Roma colocaram Sula e Mitrídates numa posição desfavorável, uma coincidência que motivou os dois a se encontrarem para firmar a Paz de Dárdanos em 85 a.C.. Mitrídates entregou 70 navios, 2 000 talentos e renunciou à suas reivindicações na Capadócia e na Bitínia. As tropas de Fímbria, quando souberam do acordo de Sula, deram início a um motim. Em situação complicada, Fímbria percebeu que não teria condições de enfrentar as tropas de Sula, muito superiores, e se suicidou, deixando Sula livre para voltar para Roma.

Diante do iminente retorno de Sula, as tropas de Cina também se revoltaram e ele também se matou, um evento que marcou o começo do fim do regime dos populares. O Senado, diante de deserções em massa entre as tropas senatoriais, tratou de negociar com Sula, mas não teve sucesso. Segundo Apiano, Sula começou a enviar tropas para Itália tão logo soube da morte de Cina e dos distúrbios subsequentes, mas, naquele momento, Quinto Cecílio Metelo Pio já havia se rebelado na África, Marco Licínio Crasso estava recrutando tropas entre sua clientela hispânica e Pompeu Estrabão fazia o mesmo entre os picenos. Considerando o baixo moral de suas tropas e o cansaço da população depois de tantos anos de guerra, o regime popular estava condenado. Muitos de seus líderes sabiam disto e trocaram de lado antes que fosse tarde demais.

Em meio a este caos, na primavera de 83 a.C., Sula desembarcou em Brundísio com seu pequeno e experiente exército de 40 000 homens. Para enfrentá-lo encontrou um exército comandado por Cneu Papírio Carbão e Caio Mário, o Jovem, sucessores de Cina. As duras batalhas que se sucederam no verão de 83 a.C. e na primavera e verão de 82 a.C. podem ser considerados como a primeira guerra civil de fato entre os romanos. Segundo os autores antigos, estima-se que morreram entre 50 000 e 70 000 romanos. Três foram as grandes vitórias de Sula: a Batalha do Monte Tifata sobre Caio Norbano Balbo (83 a.C.), a Batalha de Sacriporto sobre Caio Mário, o Jovem (82 a.C.) e a Batalha da Porta Colina (1 de novembro de 82 a.C.), já às portas de Roma.

Nesta última, Sula capturou 12 000 populares, que foram reunidos no Campo de Marte. Três mil foram executados na frente dos demais em 2 de novembro apesar de terem implorado por suas vidas. Seus gritos e lamentos foram ouvidos por toda a cidade e pelo Senado. Sula apenas sorriu quando percebeu o terror entre os senadores:

Porém, fora da cidade de Roma, os partidários de Sula tiveram que enfrentar, nos meses seguintes, algumas cidades italianas como Preneste (onde estava Mário, o Jovem) e Volterra (que conseguiu se defender até 79 a.C.). Depois da captura da primeira, 5 000 prenestinos, que haviam recebido esperanças de salvação, foram levados para fora dos muros da cidade para se prostrarem perante a Sula depois de entregarem suas armas. O impiedoso general romano ordenou que fossem todos imediatamente executados e que seus corpos fossem espalhados pelo território prenestino.

Depois da vitória completa, Sula celebrou seu triunfo sobre os pônticos e se auto-proclamou "Felix" ("afortunado"). Em 81 a.C., ele se estabeleceu como ditador, a primeira vez desde o final do século III a.C., e, ao contrário das vezes anteriores, por um prazo indeterminado.

Os primeiros momentos do regime sulano foram especialmente sangrentos, com milhares de execuções entre seus inimigos políticos. Sula, a pedido de um de seus muitos seguidores horrorizados pela dimensão do massacre, criou uma lista de condenados à morte e a pregou no Fórum Romano, na qual estavam todos os líderes do regime mariano. As propriedades dos condenados foram confiscadas e seus filhos e netos foram proibidos de se candidatarem a cargos públicos. As propriedades confiscadas eram vendidas a seguidores de Sula por preços irrisórios, arruinando seus inimigos e enriquecendo seus seguidores. Mais listas se seguiram à primeira, com milhares de nomes citados, entre os quais começaram a aparecer cidadãos sem vinculação nenhuma com Mário cujas propriedades eram cobiçadas ou cujo status era ameaçador. Um dos aliados de Sula que mais se aproveitou da situação foi Marco Licínio Crasso, cuja ambição o levou a excessos sem limite, chegando a ponto de incluir na lista um milionário romano claramente inocente, cuja vida só foi salva pela intervenção de Sula.

Na política, Sula se dedicou a re-estabelecer o poder do Senado e a diminuir a influência e o poder de todos os que contribuíram para a erosão da autoridade senatorial, especialmente os tribunos da plebe e os censores. O número de senadores dobrou, chegando a 600, e, além dos senadores nomeados para repor os optimates assassinados durante o regime mariano, diversos equestres foram escolhidos, reforçando os laços entre os proprietários de terras (senadores) e os comerciantes (equestres).

Com seu programa de reformas, Sula tratou de impedir que alguém pudesse, no futuro, repetir sua própria marcha contra Roma. Ele estabeleceu como crime de traição se um governador ou general romano conduzisse seu exército para fora dos limites da província que lhe foram designada. Sula também modernizou as leis romanas, expurgando leis obsoletas, mas assegurando que todas as funções judiciais fossem reservadas exclusivamente aos senadores, estabelecendo que ninguém com menos de trinta anos poderia se apresentar como candidato para todas as magistraturas. Seu objetivo declarado era valorizar a maturidade e a experiência para restaurar a autoridade do Senado.

Sula também castigou as regiões italianas que apoiaram os Mários, especialmente os etruscos e samnitas, que, a partir dali, deixaram de existir enquanto povos distintos. Todas as terras desocupadas foram utilizadas para assentar seus próprios veteranos, que chegavam a 120 000. Em 79 a.C., Sula renunciou à ditadura e devolveu todo o poder ao Senado, morrendo no ano seguinte aos sessenta anos de idade.

Contudo, as reformas de Sula não perduraram. Suas alterações nas leis sobreviveram, mas a renovação do Senado e a morte de muitos de seus veteranos deixaram um vácuo para que homens jovens e ambiciosos demais começassem a surgir em Roma. Um claro exemplo foram os três homens que formaram o Primeiro Triunvirato. Crasso e Pompeu, aliados de Sula durante a guerra, apesar de jovens e ambiciosos, conseguiram um enorme sucesso político. O primeiro amealhou uma fortuna enorme condenando ricos cidadãos romanos à morte para se apoderar de seus bens e Pompeu conseguiu, durante a guerra, uma grande reputação como general e era conhecido por seus inimigos como "carniceiro adolescente". Enquanto isto, o terceiro membro, Júlio César, começou sua carreira política durante o regime de Cina, que o nomeou flâmine dial e o casou com sua filha, Cornélia Cinila.

A Hispânia foi o centro do poder da facção dos populares depois da volta de Sula. Sertório, o governador da província, se revoltou e declarou a independência da Hispânia em 80 a.C.. Durante a Guerra Sertoriana, derrotou vários exércitos romanos enviados para subjugá-lo e só foi vencido em 72 a.C., quando foi traído e assassinado.

 

CRISE NA REPÚBLICA - LÚCIO CORNÉLIO SULA

 



Sula nasceu em 138 a.C. de uma família patrícia que tinha se tornado bastante insignificante. Embora bem-educado, vivia em relativa pobreza quando jovem e andava com atores, mas sua sorte logo mudou com as mortes de sua madrasta e amante, que resultaram em heranças consideráveis. Com isso, Sula pôde concorrer com sucesso ao cargo de questor de 107 a.C. e adquirir experiência militar. Ele foi prontamente selecionado para servir como um dos tenentes do general Caio Mário na guerra contra o sempre esquivo e cada vez mais perigoso ex-aliado de Roma, o rei da Numídia, Jugurta.

Sula alistou e liderou com habilidade um contingente de cavalaria durante a campanha numídica, durante a qual ele ganhou popularidade entre as fileiras por compartilhar as agruras dos legionários comuns. À medida que Mário gradualmente capturava fortalezas de Jugurta e desbaratava seus exércitos, ele encarregou Sula de negociar com o vacilante rei Boco, da Mauritânia, uma eventual mudança de lado. Eventualmente Boco concordou em entregar Jugurta em pessoa a Sula, o que na prática marcou o fim do conflito em 105 a.C..

Sula aproveitou cada oportunidade para se gabar de que tinha sido ele quem terminara a guerra na verdade, e não Mário, o que sem dúvida alguma aborreceu o general. Apesar disso, havia questões mais sérias a serem consideradas. As tribos bárbaras do norte, após humilharem vários exércitos romanos, ameaçavam invadir a península italiana. Mário foi encarregado de subjugar estas tribos, os Cimbros e os Teutões, e novamente escolheu o competente Sula como subordinado. Porém, no decorrer da campanha, o relacionamento entre os dois tornou-se tão difícil que Sula solicitou sua transferência para outro exército, liderado pelo co-Cônsul Catulo. A transferência foi aprovada e uma vez mais Sula provou seu valor, mesmo que as forças de Catulo tivessem sido relegadas a um papel de apoio na parte final do conflito, que terminou com a completa derrota das tribos bárbaras em 101 a.C..

Com ambas as guerras contra Jugurta e os bárbaros concluídas, Sula concentrou-se no avanço de sua carreira política. Em 99 a.C., ele se candidatou sem sucesso para o cargo de pretor, confiando em seus sucessos militares. Sem se deter pela derrota, pleiteou o mesmo cargo novamente no ano seguinte, com uma plataforma de jogos gratuitos sem precedentes e, como seria de se esperar, foi devidamente eleito. Após o término do mandato, passou a governar a província romana da Cilícia, na Ásia Menor, a partir de 96 a.C., demonstrando aptidão administrativa e perícia militar.

As ambições políticas de Sula tiveram um baque abrupto quando Roma mergulhou em sua primeira guerra civil (91 a.C.), a chamada Guerra Social. Os aliados italianos de Roma, que reivindicavam a cidadania romana há anos, decidiram ganhar sua independência e deflagraram uma revolta generalizada. Sula lutou por um breve período junto com Mário, ganhando grande notoriedade ao neutralizar de forma impressionante muitos inimigos. Devido à sua recente popularidade, foi quase unanimemente eleito para o consulado em 88 a.C.. Porém, a política doméstica provou-se difícil de administrar e um descontentamento de facções levou à erupção de um violento tumulto. A situação ficou tão perigosa que Sula foi forçado a buscar refúgio na casa de Mário, ainda que este estivesse auxiliando a oposição ao antigo subordinado.

Enquanto isso, uma ameaça vinha se desenvolvendo rapidamente no leste. O rei Mitridates do Ponto invadira a província romana da Ásia e orquestrara o massacre de 80.000 romanos e italianos. Isso requeria uma ação rápida e Sula, como Cônsul eleito, recebeu o altamente cobiçado comando, o que enraiveceu Mário, que também o desejava. Quando Sula partiu de Roma para preparar seu exército, em 88 a.C., Mário manipulou a aprovação de uma legislação que substituiu Sula por ele próprio como chefe da expedição. Mário rapidamente despachou subordinados para facilitar a transferência de poder, mas eles foram apedrejados até a morte pelas tropas de Sula. A facção pró-Mário respondeu de forma igualmente violenta, executando apoiadores de Sula em Roma.

Sula recusou-se a entregar seu ambicionado comando e decidiu consolidar sua posição em Roma. Ele inverteu o rumo de suas tropas e tornou-se o primeiro general romano a liderar um exército hostil através do pomerium (limite sagrado em torno de Roma) e tomar a cidade. Mário não esperava uma ação tão inesperada e sem precedentes e só conseguiu coordenar uma defesa limitada e insuficiente. Ele fugiu da cidade e Sula o proclamou inimigo público, assim como outros onze apoiadores. Isso significava uma sentença de morte, mas somente um dos inimigos públicos acabou capturado e morto, Sulpício. Ele foi traído por seu escravo que, por ordens de Sula, primeiro recebeu sua liberdade e depois foi atirado para a morte da Rocha Tarpeia pelo crime de trair seu senhor.

Uma vez satisfeito com a instalação de uma administração favorável, ele partiu em 87 a.C. para confrontar Mitridates, cujo controle e influência cresciam rapidamente através do leste, mas sem demora seus planos foram frustrados. O cônsul Lúcio Cornélio Cinna aliou-se a Mário, que retornou a Roma, e a vingança começou. Sula foi declarado inimigo público e muitos de seus amigos e aliados acabaram executados em expurgos conduzidos pelo governo pró-Mário. Eles até despacharam legiões recém-convocadas para vencer o exército de Mitridates. Sem se perturbar, Sula combateu com sucesso os generais do Ponto e eventualmente obteve um tratado de paz apressado e bastante leniente com Mitridates. Com o conflito resolvido, o exército comissionado por Cinna desertou em favor de Sula, que agora estava livre para acertar as contas com seus inimigos em Roma.

Seu mais implacável inimigo, Caio Mário, morrera em 86 a.C., possivelmente de pleurisia. Cinna foi assassinado por tropas amotinadas em 84 a.C. durante os preparativos para o embarque rumo à Grécia. A facção mariana não estava derrotada ainda, mas dependia cada vez mais de lideranças menos capazes.

Em 83 a.C., Sula marchou em direção a Roma no comando de um exército com o objetivo de assumir o controle da capital da República, eliminar potenciais ameaças e fazer valer sua vontade pela segunda vez. O que resultou foi outra guerra civil, que teve seu clímax (mas não terminou) às portas de Roma - no Portão da Colina - com a ajuda de dois recém-chegados, Cneu Pompeu e Marco Licínio Crasso. Após a vitória, alguns legionários derrotados receberam clemência, mas outros não foram tão afortunados. Sula massacrou milhares de soldados que já tinham se rendido. Em 82 a.C., Sula assumiu a ditadura pelo período que desejasse. A Constituição romana permitia a nomeação de um ditador em tempos de emergência suprema, mas com um prazo máximo de seis meses. O último ditador fora nomeado há 120 anos.

Sula usou seus poderes ilimitados para reformar unilateralmente a República segundo seu ideal de governo. Ele reduziu os poderes dos tribunos do povo, representantes eleitos cujo cargo era sacrossanto e permitia o veto a leis e a possibilidade de aprovar legislação diretamente na Assembleia Popular, passando por cima do Senado. O ditador determinou que todas as novas leis deveriam ser primeiro aprovadas pelo Senado, elevando de forma significativa a influência dos senadores e restringindo a influência política dos tribunos. Ele estabeleceu idades mínimas para ocupantes de cargos públicos e a ordem pela qual os principais postos deveriam ser ocupados ao longo do cursus honorum (a carreira política romana), além de lotar o Senado com seus apoiadores. Foram fixados preços máximos para muitos produtos e serviços e limites para as taxas de juros. Sula vendeu imunidade tributária para algumas cidades e, numa medida bastante impopular, aboliu a distribuição gratuita de grãos. Apesar de todos os seus esforços, muitas das reformas foram rapidamente repelidas, algumas das quais por seus antigos aliados, Pompeu e Crasso.

Caso sua ditadura se limitasse às reformas, talvez fosse lembrado de forma diferente, mas Sula instituiu as proscrições, que contribuíram para sua transformação num tirano sanguinário. A cada dia, uma lista de condenados era postada no fórum. Quem constasse nela tinha as propriedades confiscadas e aquele o matasse seria recompensado pelo estado. Uma vez que a tarefa estivesse concluída, Sula inspecionava pessoalmente as cabeças decapitadas, que serviam de decoração em sua casa e no fórum. Milhares foram incluídos nas listas de proscrição com ou sem justa causa. O jovem Júlio César foi proscrito apenas por se recusar a se divorciar de sua esposa, filha de Cinna. Crasso, um dos subordinados de Sula, colocou nomes na lista de proscrições simplesmente porque cobiçava suas propriedades. Vários nomes foram adicionados postumamente para justificar assassinatos não-autorizados. O expurgo durou por meses e levou às mortes de um número incerto de integrantes das classes mais elevadas de Roma, com estimativas que variam de 1.000 a 9.000 mortos. No entanto, sob o domínio de Sula, os falecidos também estavam em risco. Ele ordenou que o cadáver de sua nêmesis, Mário, fosse removido de sua cripta, arrastado através da cidade e feito em pedaços.

Em 81 a.C., quando se convenceu de que tinha criado um governo estável e erradicado todas as ameaças potenciais, Sula renunciou formalmente da ditadura. Porém, permaneceu no poder como cônsul em 80 a.C. e, ao término do seu mandato, retirou-se para uma aposentadoria parcial. Assim que colocou de lado a autoridade suprema, um homem bombardeou-o ostensivamente com insultos. O outrora violento ditador recebeu sem reagir a onda de abusos e apenas exclamou: "Este rufião vai garantir que ninguém nunca mais renuncie ao poder absoluto."

Certo dia, em 78 a.C., enquanto exigia em altos brados o estrangulamento de um funcionário corrupto, Sula teve uma hemorragia oral e morreu na manhã seguinte, provavelmente vítima do alcoolismo crônico. Seus restos mortais foram sepultados e seu túmulo exibia um epitáfio supostamente escrito pelo próprio Sula, e que dizia mais ou menos o seguinte: “Nenhum amigo jamais me serviu e nenhum inimigo jamais me prejudicou sem que eu não tivesse retribuído na mesma moeda”.

Sula defendeu com firmeza Roma, os interesses romanos e o status quo republicano na maior parte de sua carreira. Se apenas isso fosse o resumo do trabalho de sua vida, sem dúvida seria saudado como um heroico guardião da República. Porém, suas ações foram muito além disso. Ele alegava querer reparar o frágil governo republicano, mas implementou suas reformas através da força bruta. Violentamente, desnecessariamente e sem respeitar os limites constitucionais, tomou o controle do governo e desencadeou um reino de terror indiscriminado, uma lição para outros ambiciosos generais, incluindo Júlio César. Na verdade, muitos dos conflitos domésticos deste período poderiam ter sido facilmente evitados, mas Roma simplesmente não era grande o bastante para a competição entre os egos mesquinhos de Mário e Sula.

 

CRISE NA REPÚBLICA - CAIO MÁRIO




Caio Mário (c. 157-86 a.C.) foi um bem-sucedido comandante militar e político que foi aclamado por salvar Roma da iminência de um colapso. Porém, infelizmente, seu nome sobreviveu em relativa obscuridade porque os seus feitos foram eclipsados por sua derradeira queda. Não obstante os seus copiosos atos condenáveis, ele também deve ser lembrado pelos seus estrondosos sucessos militares e políticos e pela indelével marca que deixou em Roma.

Por volta de 157 a.C., Mário nasceu numa família plebeia num povoado italiano chamado Ceraete, perto de Arpino. Nenhum dos ancestrais de Mário jamais havia sido eleito a um cargo político romano, e ele inclusive afirmava ter sido criado na pobreza, o que significava que ninguém seriamente esperava vê-lo tornar-se uma pessoa de importância.

Em tenra idade, ele entrou nas legiões de Roma e serviu com integridade. Depois, estabelecendo suas relações com romanos influentes e expondo seu honorável serviço militar, ele entrou na arena política e ascendeu na escala política, o cursus honorum ("caminho das honras"). Ele foi primeiro eleito ao tribunado militar e depois ao cargo de tribuno da plebe em 119 a.C., de pretor em 115 a.C. e, na sequência, foi nomeado ao governo da província da Hispânia Ulterior. Ao longo do início da sua carreira política, ele provou ser um hábil e consciencioso político. De fato, Mário "ganhou cargo atrás de cargo, sempre se comportando em cada um deles para ser considerado digno de uma posição mais elevada do que aquela que ele detinha" (Salústio, A Guerra de Jugurta, 63.5).

Guerra Jugurtina

Após o seu governo, a carreira política de Mário temporariamente arrefeceu. Nesse ínterim, ele se casou com uma mulher patrícia de nome Júlia, que mais tarde ostentaria um famoso sobrinho, Júlio César, mas o intervalo de Mário longe da vida pública durou pouco. Em 109 a.C., o cônsul Quinto Cecílio Metelo foi nomeado para pôr fim ao contínuo e embaraçoso conflito contra o astuto rei Jugurta da Numídia. Metelo, por seu turno, indicou Mário como seu legado, o que era uma imensa oportunidade. Os dois viajaram à África, onde retreinaram as legiões e tentaram enfrentar Jugurta, porém Mário acabou concluindo que Metelo carecia de liderança, e que a sua estratégia era demasiado conservadora.

Então, Mário navegou até Roma, onde implementou uma efetiva estratégia de campanha eleitoral, adulando os mais baixos estratos da sociedade por meio da demonização da aristocracia. Seu truque funcionou, e ele foi retumbantemente eleito ao consulado de 107 a.C. Depois ele flexionou a sua musculatura política, ingratamente removeu Metelo do comando na Numídia e, por fim, transferiu-o para si mesmo.

Mário prontamente recrutou um exército muito maior, incluindo voluntários dentre as classes mais pobres, o que era contrário à política romana, e alterou a estratégia na Numídia. Ele, então, partiu para confrontar Jugurta. Em pouco tempo, Mário infligiu duras derrotas à coalizão jugurtina, matando dezenas de milhares de inimigos romanos e aplicando pressão nos aliados numidianos. Em 105 a.C., um dos supostos amigos de Jugurta concordou em capturar e entregar o sagaz (embora cercado) rei aos romanos, e um dos hábeis oficiais de Mário, Sula, acompanhou a rendição final de Jugurta. Assim que Jugurta ficou sob a custódia de Mário, isso sinalizou o fim do conflito, em grande medida graças às operações militares de Mário e ao incremento das tropas.

Não havia muito tempo para celebrar porque uma poderosa tribo bárbara do norte, chamada de cimbros, emergiu e pôs em perigo a República. Os cimbros estabeleceram uma temível aliança com os teutões, os ambrões e outros para desafiar Roma. Em resposta, em 105 a.C., Mário foi inconstitucionalmente eleito in absentia ao seu segundo consulado e foi incumbido de defender a República da coalizão bárbara. Depois de celebrar um esplêndido triunfo romano, Mário viajou ao norte com o seu exército, treinou-o e preparou-o para uma campanha que poderia determinar o destino de Roma, mas a aliança bárbara não chegou quando se esperava. Por mais dois anos ele aguardou e, em cada ano, o povo romano o reelegeu inconstitucionalmente como cônsul.

Finalmente, em 102 a.C., os batedores de Mário reportaram o avanço dos bárbaros em duas ou possivelmente três colunas. Mário apressou-se para encontrar as tribos, mas ele sagazmente optou por enfrentá-las individualmente e apenas depois que cada uma tivesse cometido um erro estratégico. Primeiro, ele derrotou e metodicamente abateu os ambrões e, na sequência, os teutões nas proximidades de Águas Sextas. Em seguida, depois de ser reeleito cônsul em 101 a.C., Mário confrontou os cimbros e sistematicamente os massacrou, pondo fim ao longo conflito. Durante essa guerra em particular, os romanos haviam matado um número estimado de 360.000 homens e apreendido outros 150.000, que logo foram vendidos como escravos.

Reformas Militares

Durante o longo mandato de Mário como um comandante militar, ele provou ser um general inventivo e instituiu muitas reformas, algumas das quais perduraram nas legiões por muitos anos. Enquanto se preparava para se dirigir à África para enfrentar Jugurta, ele alistou romanos de todas as classes no seu exército, incluindo as pobres, embora isso fosse contrário à política romana. No entanto, a medida fez expandir grandemente a reserva de recrutamento da República e mais tarde se tornou procedimento operacional padrão na Roma Antiga.

Durante a Guerra Címbria, ele se empenhou em livrar o seu exército de quantos animais de carga lentos fosse possível livrar-se para que as tropas fossem rápidas e ágeis. Por isso, exigiu que os seus legionários carregassem boa parte dos seus suprimentos. Embora muitos soldados tenham protestado contra essa carga adicional, tal reforma provou ser sensata e efetiva, tornando-se permanente. Afora as medidas táticas, Mário é também tido como aquele que deu início ao hábito de pôr no topo dos estandartes legionários romanos apenas uma águia de prata. Originalmente, os estandartes eram adornados com a imagem de qualquer um dentre múltiplos animais, porém a águia tornou-se um longevo sustentáculo das legiões graças a Mário.

O Sexto Consulado de Mário

Após a Guerra Címbria, Mário retornou a Roma diante de uma população agradecida, que o considerou um dos fundadores de Roma e o recompensou com o seu segundo magnífico triunfo; eles inclusive lhe ofereceram libações nos rituais. Nesse ponto, ele almejou o consulado mais uma vez, mas recorreu ao suborno para convencer os votantes, que asseguraram a sua eleição. Tão logo assumiu cargo em 100 a.C., ele continuou com uma imprudente aliança com políticos inescrupulosos, incluindo Saturnino, que ulteriormente se revoltou contra o Estado. Mário relutantemente respondeu erigindo uma força militar e com sucesso neutralizou Saturnino. No entanto, muitos romanos voltaram-se contra Mário ao perceberem que ele inicialmente havia se associado a um criminoso assassino e sedicioso. Como resultado, a sua outrora vasta influência se esvaneceu em alguma medida.

Dessa forma, Mário passou quietamente os vários anos seguintes como um membro veterano do Senado Romano, mas em 91 a.C., um desastre eclodiu perto de Roma quando os aliados italianos da República se revoltaram, provocando a calamitosa Guerra Social. As elites romanas governantes requisitaram que Mário e outros militares bem-sucedidos liderassem as tropas de Roma contra os italianos, e Mário devidamente obedeceu e competentemente comandou as legiões ao longo do ano 90 a.C. Porém, após uma temporada de campanha, ele se afastou, alegando em público ter enfermidades, mas ele provavelmente foi forçado a sair do poder pelos seus inimigos senatoriais.

Conforme a Guerra Social parecia chegar ao fim, o rei Mitrídates do Ponto emergiu como a mais grave ameaça a Roma, e Mário desejava fortemente liderar as legiões de Roma contra o belicoso monarca. Porém, a Sula foi depois dado o comando na Guerra Mitridática. Depois que ele partiu a fim de preparar as suas tropas para a expedição vindoura, Mário instruiu outro inescrupuloso tribuno, Sulpício, a introduzir uma medida para que o povo romano transferisse o comando na Guerra Mitridática a Mário, o que ele ao cabo fez. Ela passou, mas, em vez de obedecer à vontade do povo, Sula traiçoeiramente volveu as suas tropas contra a própria Roma em 88 a.C. Depois de brevemente tentar repelir os legionários invasores de Sula com uma multidão recrutada às pressas, Mário foi forçado a se retirar da Cidade Eterna, e Sula obteve o controle da República.

Antes de partir pela segunda vez para confrontar Mitrídates, Sula declarou Mário um inimigo do Estado, ofereceu uma recompensa pela sua cabeça e o sentenciou à morte. Como resultado, Mário vivia a vida de um fugitivo desesperado, enfrentando muitas humilhações e flertando com a morte. Ele, ao cabo, fugiu para a África, onde se esquivou dos seus inimigos e lentamente reuniu uma pequena força para o seu posterior retorno a Roma. Em 87 a.C., os dois cônsules da República, Cina e Otávio, estavam no meio de uma violenta discussão, o que proveu a Mário uma chance de retornar. Ele, então, navegou rumo à Itália com as suas recém-recrutadas tropas e obedientemente se ofereceu para servir ao cônsul Cina.

Destarte, Mário ajudou Cina, e em pouco tempo o cocônsul de Cina foi derrotado e forçado a render-se, permitindo que ambos, Mário e Cina, entrassem de novo em Roma. No entanto, eles não foram vencedores graciosos. Mário outrora já havia salvaguardado Roma, mas ele e o seu parceiro, Cina, volveram as suas atenções para as suas vinganças pessoais. Eles, então, assassinaram os seus inimigos domésticos sem julgamentos. Embora os historiadores antigos, que eram frequentemente hostis a Mário, tenham afirmado que se tratou de um expurgo generalizado, "os mais assíduos pesquisadores só conseguem atribuir a Mário a responsabilidade por sete das catorze vítimas conhecidas". Decerto, deve ter havido muito mais vítimas do que isso nesse "pogrom" horrendamente imoral. No entanto, é ainda pouco em comparação com as derradeiras e sangrentas proscrições de Sula, que supostamente custaram a vida de milhares. Ainda assim, a vingança irrestrita de Mário arruinou por completo a sua outrora larga e louvável reputação.

Independentemente da onda de mortes, ambos, Mário e Cina, declararam a sua candidatura para o consulado do ano seguinte e, sem nenhuma surpresa, foram eleitos. Mário obteve o seu profetizado sétimo consulado, mais do que qualquer outro romano já havia desfrutado até esse ponto, mas o seu mandato durou pouco. Após alguns dias nele, sua mente e seu corpo começaram a se debilitar, e, em meados de janeiro de 86 a.C., ele morreu, segundo relatos, de pleurisia quando tinha cerca de 70 anos. Mário deve ter desfrutado de um elegante funeral, mas, infelizmente, essa não foi a última vez que os romanos o vislumbraram. Quando Sula retornou depois de derrotar Mitrídates, ele iniciou um massacre irrestrito e ordenou que os seus subordinados exumassem os restos de Mário em decomposição, que foram profanados e descartados como um lixo odioso. Isso "foi um ignominioso fim e a máxima desonra para o outrora herói que se tornou um pária de Roma"

 

CRISE NA REPÚBLICA - OS IRMÃOS GRACO

 


Tibério Graco 169 ou164 a.C. - 133 a.C.

Tibério começou sua jornada no mundo da política romana através da via militar, servindo na queda de Cartago, que encerrou a Terceira Guerra Púnica (149-146 a.C.), sob o comando de seu cunhado Cipião Emiliano. Ele "logo aprendeu a apreciar o nobre espírito de seu comandante, que era adequado a inspirar fortes sentimentos de imitação". Após os andaimes e máquinas de cerco serem colocados nos lugares, Tibério foi um dos primeiros a escalar os muros. De acordo com Plutarco, enquanto em Cartago, ele ultrapassou a todos em obediência e coragem e "foi considerado com grande afeição enquanto continuou no exército; e deixou atrás de si, quando partiu, um forte desejo de retornar"

Tibério ingressou no cursus honorum [carreira pública romana] como um quaestor (questor) em 137 a.C., servindo sob o comando do cônsul Hostílio Caio Mancino, na Espanha. A campanha contra guerrilheiros insurgentes, os Numantinos, quase levou a carreira militar e política de Tibério a um fim precoce. Desde o início, as coisas deram terrivelmente errado. Os romanos foram enganados e, após falhar numa tentativa de escapar no meio da noite, forçados a se render e a concordar com um tratado que Tibério ajudou a negociar. Houve indignação em Roma: legiões romanas não se rendem. Mancino foi retirado do comando e devolvido aos insurgentes acorrentado. Tibério não foi acusado - "os soldados  reconheceram Tibério como o salvador de muitos cidadãos, imputando ao general todos os malogros ocorridos"

Em seu período na Espanha, ele observou algo que iria assombrá-lo e mudar a direção de sua vida. Enquanto viajava pelo interior, notou que a maior parte do trabalho no campo era feito por escravos. A pequena família rural tinha desaparecido completamente. Após seu retorno a Roma, soube que, quando a República romana derrotava seus inimigos, confiscava suas terras. Embora parte delas fosse para os pobres e indigentes, que pagavam uma pequena taxa para o tesouro público, a maior parcela tornava-se ager publicus, ou áreas públicas comunitárias. Infelizmente, a maior parte destas terras públicas terminava como grandes propriedades ou latifundia. Com o tempo, o fazendeiro camponês, em pequena escala, simplesmente desapareceu. Um segundo fator que contribuía para esta situação era a contínua demanda do exército romano por mais homens. Com a ausência dos trabalhadores rurais, a pequena fazenda familiar falia e acabava comprada por grandes proprietários. Plutarco assinala que os pobres e indigentes aproveitaram as terras públicas comunitárias por algum tempo, mas os ricaços começaram a “expulsar o povo mais pobre”. Tibério compreendeu que algo precisava ser feito.

A Reforma Agrária de Tibério

Em 133 a.C., Tibério foi eleito um dos dez tribunos da plebe. Escolhido através de votação pelo concilium plebis ou Assembleia Plebeia por um mandato de um ano, um tribuno podia propor leis e convocar sessões do Senado. Tibério aproveitou seus recém-adquiridos poderes e propôs uma lei de reforma agrária, a lex agraria, que previa uma distribuição justa das terras públicas. Percebendo a inevitável resistência do Senado e numa tentativa de aplacá-los, ele renovou uma legislação antiga e nunca aplicada, banindo a ocupação de mais de 500 iugera de terra (trezentos acres).

Como toda legislação precisava ser apresentada ao Senado primeiro, Tibério temeu que sua proposta pudesse ser vetada. Assim, ele simplesmente ignorou o Senado e levou a legislação diretamente para votação na Assembleia. Outro tribuno, Marco Otávio, jurou usar seu poder de veto para interromper a leitura. Quando a lei estava sendo apresentada, Otávio interveio e, como prometido, bloqueou todos os procedimentos. No dia seguinte, o resultado foi o mesmo. Se não fosse lida, a lei não poderia ser votada. Tibério teve uma solução simples: na sessão seguinte, apresentou uma segunda lei, removendo Otávio do cargo de tribuno. Com o opositor fora do caminho, a lei foi lida e aprovada. Em seguida, Tibério criou uma comissão para supervisionar a implementação da nova legislação.

A comissão – o próprio Tibério, seu sogro e Caio – pesquisou as condições daqueles que possuíam terras públicas para impor o limite de 500 iugera. A nova lei estipulava que a posse da terra não significava propriedade; porém, ela permanecia livre de aluguel. O estado poderia reaver todas as terras públicas que excedessem o limite legal. Com a aprovação da lei, Tibério ficou preocupado com o financiamento de sua implementação. Para sorte do tribuno, o rei de Pérgamo, Átalo III, morreu e deixou seu reino em herança para Roma

 Morte de Tibério

Embora considerado um benfeitor para os pequenos agricultores, a natureza franca de Tibério e sua estratégia de evitar o Senado geraram uma ferrenha oposição. Ao se candidatar para um segundo mandato como tribuno, ele reuniu seus partidários no Templo de Júpiter, na Colina Capitolina, onde os votos estavam sendo contados. Tibério sabia que, se falhasse em vencer a eleição, sua lei seria repelida. Um dos opositores mais estridentes era o pontifex maximus Públio Cornélio Cipião Nasica, primo de Tibério. Como sua oposição se tornava ainda mais sonora, as rixas se espalharam pela cidade.

Numa tentativa de interromper a votação, Nasica e vários senadores irromperam no templo, carregando armas improvisadas e exigindo a decretação de um estado de emergência. Plutarco relata que os agressores de Tibério tinham "se equipado com porretes e bastões de suas casas e pedaços de bancos e cadeiras". Na colina, pouco podia ser feito para resistir ao ataque de Nasica e seus companheiros. Tibério foi espancado até a morte; o cadáver acabou sendo atirado ao Rio Tibre, junto com 200 (alguns afirmam que 300) de seus partidários. Alvo da fúria popular, Nasica foi enviado para uma missão no exterior e morreu em Pérgamo. A quietude finalmente retornou a Roma, mas logo outro Graco chamou a atenção da cidade.

Caio Semprônio Graco 154 a.C. - 121 a.C.

No ano seguinte após o assassinato de Tibério, seu irmão Caio Semprônio Graco evitou o Fórum e todos os espaços públicos de Roma. Plutarco descreveu este isolamento:

" seja pelo receio dos inimigos de seu irmão ou pelo desejo de fazê-los mais odiosos junto ao povo, absteve-se das assembleias públicas e viveu discretamente em sua própria casa.  Caio dedicou-se arduamente ao estudo da eloquência, como ferramentas com as quais poderia aspirar aos negócios públicos; e ficou bastante aparente que não pretendia passar seus dias na obscuridade."

Quando finalmente saiu de seu recolhimento, os romanos o receberam cordialmente e começaram a encorajá-lo a se tornar um tribuno. Já tendo servido ao exército, ele ingressou no cursus honorum como questor designado para a Sardenha, sob Lúcio Aurélio Orestes. Quando seu mandato foi estendido injustamente, ficou indignado e voltou a Roma. Acusado de abandono do dever, ele usou a habilidade oratória para ser absolvido, alegando que servira mais ao exército e como questor do que qualquer outra pessoa. Novas acusações foram feitas contra ele, desta vez por supostamente estimular a insurreição entre os aliados, e novamente ele precisou limpar seu nome.

 As Leis de Caio

Como Tibério, ele percebeu a necessidade de reforma e, a despeito dos receios de seus oponentes e dos desejos de sua própria mãe, foi eleito tribuno em 123 a.C.. Conforme Anthony Everitt na obra The Rise of Rome [A Ascensão de Roma], Caio tinha “uma visão mais larga e abrangente do que seu irmão”. Seu objetivo era “purificar o Senado e fazê-lo mais responsivo aos interesses do povo”. Ele imediatamente apresentou duas novas leis. A primeira estabelecia que qualquer funcionário romano destituído de um cargo público estava proibido de atuar novamente em qualquer outro (possivelmente visando a Otávio, velha nêmesis de seu irmão), mas sua mãe convenceu-o a retirar esta proposta de votação. A segunda lei proibia julgamentos com pena capital sem a aprovação da Assembleia. Qualquer indivíduo que tivesse desprovido outro cidadão de seus direitos cívicos através de execução ou exílio, como se ele fosse um inimigo de Roma, precisaria ser levado diante do povo; a lei teve aprovação fácil na Assembleia.

Para deixar claro que algumas terras públicas iriam para os mais pobres, Caio em seguida reafirmou a lei agrária do irmão, mas retirou algumas áreas da distribuição. Como um antigo militar, ele propôs que um soldado romano deveria ser equipado por conta do estado sem qualquer dedução em seu pagamento. Propôs a criação de três novas coloniae na Itália e no sítio abandonado de Cartago, que seria renomeado como Junônia, em homenagem à deusa Juno. Plutarco afirma que o tribuno deu especial atenção à construção de estradas, as quais “foi cuidadoso em torná-las mais belas e agradáveis”. Para evitar carência de alimentos e possível fome generalizada, Caio estocou reservas de grãos normalmente importadas da África, Sicília e Sardenha com a construção de celeiros. Sua lex frumentaria, aprovada pela Assembleia, determinava que o estado poderia vender uma certa quantidade de grãos mensalmente aos cidadãos por preços subsidiados.

Em seguida, Caio atacou a corrupção nos cargos públicos, principalmente fraude, suborno e roubo. Um tribunal especial deveria cuidar de tais casos, com um júri composto por senadores e com atribuições de recuperar ou buscar compensação para a aquisição ilegal de dinheiro ou propriedade. Porém, muitos dos acusados acabaram absolvidos por serem amigos íntimos de senadores. Para remediar isso, senadores foram barrados dos júris e substituídos por equites (cavaleiros). Algumas das propostas não tiveram boa recepção tanto dos funcionários governamentais quanto do povo. Por exemplo, Caio planejava conceder cidadania romana total a certas comunidades com direitos latinos ou cidadania de segunda classe. A proposta foi rejeitada e deixou de ser considerada seriamente até a Guerra Social, em 91 a.C..

A Morte de Caio

Sem conseguir um terceiro mandato consecutivo como tribuno, ele deixou Roma para visitar o novo sítio de Junônia. Após retornar à cidade, deparou-se com oposição cerrada, principalmente de Lúcio Opímio. Após tornar-se cônsul, Opímio começou a reverter muitas leis de Caio. O Senado temia o poder e influência do ex-tribuno e ordenou que Opímio “deveria ser investido com poder extraordinário para proteger a comunidade e suprimir todos os tiranos”. Numa repetição do dia da morte de Tibério, Opímio disse aos senadores para se armarem. Percebendo que havia problemas à vista, Cornélia enviou guarda-costas para proteger o filho. Decretou-se um estado de emergência. Caio e seus partidários, em busca de segurança, reuniram-se na Colina Aventina. Opímio ordenou que flechas fossem disparadas contra a multidão.

A despeito dos desejos de seus apoiadores, Caio armou-se somente com uma pequena adaga. Sua esposa, Licínia, deu-lhe um sombrio aviso quando ele saiu de casa: “Você vai expor sua pessoa aos assassinos de Tibério desarmado preferindo antes sofrer a pior das injúrias a praticá-la por si próprio”. De acordo com o relato de Plutarco, Caio buscou santuário no Templo de Diana, onde tentou o suicídio, mas foi impedido por dois amigos. Ele e seus partidários então se reuniram numa das pontes que cruzavam o Rio Tibre, a Pons Sublicius. Os apoiadores tentaram atrasar os agressores, mas a resistência foi fútil e tanto seu escravo quanto Caio acabaram mortos. Ele foi decapitado e a cabeça entregue a Opímio, enquanto o corpo e os de cerca de 3.000 de seus partidários (condenados por um tribunal especial) foram jogados no Tibre. Conta-se que, com a morte de seus dois filhos, Cornélia deixou Roma para Miseno.


REPÚBLICA ROMANA - CRISE NA REPÚBLICA

 



A República Romana era a potência política, militar e econômica na região, ninguém tinha mais poder do que o Senado romano.

Após derrotar os Catargineses, os romanos praticamente mandavam no mundo, mas a situação dos pobres ficaram mais trágicas, pois com a riqueza dos patrícios romanos, o abismo entre plebeus e patrícios, ficou mais evidente.

As lutas e revoltas sociais por melhorias ficaram mais acentuadas, os patrícios sufocavam tais revoltas com mais violência, e esse ciclo vicioso ficou cada vez mais encarniçada e sangrenta. O governo achou melhor traçar outra estratégia para combater as revoltas populares, pois quanto mais ele prendiam, torturavam e matavam os revoltosos, a plebe ficava mais descontente e as agitações populares aumentavam.

Foi aí que nasceu a Política do Pão e Circo, onde a diversão e comida apaziguou por um tempo o povo. Nessa política, o plebeu ganhava um quilo de farinha de trigo e assistia aos jogos (corridas de bigas) gratuitamente.

O Pão e Circo por um tempo conseguiu fazer o efeito desejado somente nos centros urbanos, pois no campo, tal política não teve o efeito desejado, os camponeses continuaram seus protestos e as revoltas por melhorias recomeçaram.

Quanto entram em cena, os Irmãos Graco, Tibério e Caio eram filhos de Tibério Semprônio Graco e Cornélia, a segunda filha de Público Cornélio Cipião Africano, herói da Batalha de Zama, na Segunda Guerra Púnica, e patriarca de uma das mais ricas e aristocráticas famílias romanas, eles tentaram fazer as reformas de que Roma tanto precisava.

Cornélia deu à luz a doze crianças, das quais somente três sobreviveram até a idade adulta: Tibério, Caio e uma filha, Semprônia, que se casaria mais tarde com o primo de sua mãe, o comandante romano Cipião Emiliano. Após a morte do marido, em 154 a.C., Cornélia decidiu controlar seus próprios assuntos e não se casar novamente. Muito independente e dedicada aos dois filhos, ela lhes proporcionou uma educação aprimorada em retórica e filosofia grega, através de um tutor.

O historiador Simon Baker, em sua obra Ancient Rome [Antiga Roma], afirmou que, após a morte do pai, Tibério deparou-se com a responsabilidade de levar adiante o nome do pai, bem como o prestígio da família da mãe. Cornélia encorajava os filhos a demonstrar autodisciplina e coragem: algo evidente em seu período como tribunos. Para aqueles ao seu redor, Tibério era visto como mais gentil e sereno, enquanto o irmão, nove anos mais novo, comportava-se de forma mais tensa e impetuosa. Na obra Vidas, Plutarco escreveu sobre as personalidades de ambos: Tibério, brando e moderado; Caio, áspero e passional. Ele acrescentou que seu valor contra os inimigos de Roma e seu "cuidado e diligência nos cargos públicos e seu autocontrole eram igualmente fora do comum"