Quando pensamos no passado americano, nossa imaginação recria quase instantaneamente os cenários clássicos de Hollywood, com ruas largas, caubóis destemidos e duelos ao meio-dia. No entanto, a realidade histórica das cidades do Velho Oeste era muito mais crua e bem menos romântica do que os filmes sugerem. Esses locais eram, na verdade, ambientes caóticos, fedorentos e perigosos, onde a vida valia muito pouco e a lei nem sempre estava presente para proteger os cidadãos.
A construção desse mito cinematográfico esconde uma rotina de sobrevivência extrema. As cidades do Velho Oeste não eram palcos de heroísmo constante, mas sim assentamentos improvisados onde doenças podiam matar muito mais rápido do que qualquer arma de fogo. Eram lugares repletos de pessoas que sonhavam com fortuna e liberdade, dispostas a enfrentar condições sanitárias precárias e uma violência brutal que passava longe da honra dos duelos organizados que vemos nas telas.
Diferente das metrópoles planejadas, as cidades naquela fronteira não nasciam de estudos urbanísticos, mas sim de explosões de oportunidade geradas pela descoberta de recursos como ouro, prata ou petróleo. Esses locais eram chamados de “boomtowns”. Um exemplo clássico dessa dinâmica foi Virginia City, em Nevada. Após a descoberta de minérios na região em 1859, o local passou de algumas cabanas improvisadas para uma metrópole com 25.000 habitantes em menos de uma década.
Contudo, a mesma velocidade que trazia o progresso também decretava o fim desses lugares. Assim que as minas se esgotavam, a população partia, deixando para trás estruturas vazias. Estima-se que hoje existam mais de 3.800 cidades fantasmas espalhadas pela região. No auge, esses locais não tinham ruas planejadas, escolas ou tribunais; eram amontoados de tendas e barracões onde a ordem só chegava se a cidade conseguisse sobreviver tempo suficiente.
A sujeira e o verdadeiro cheiro do Oeste
Hollywood costuma retratar a rua principal como um local limpo e pronto para a ação, mas na vida real ela era praticamente intransitável. Durante o verão, a poeira formava nuvens sufocantes, enquanto no inverno a lama chegava a engolir as botas até o joelho. O tráfego constante de cavalos e carroças deixava um rastro de sujeira difícil de controlar. Em grandes centros da época, como Dodge City, acumulavam-se centenas de toneladas de esterco de cavalo por ano.
Essa falta de saneamento básico transformava as cidades do Velho Oeste em focos de atração para ratos e moscas. Embora moradores reclamassem em jornais locais, como o Dodge City Times, a sujeira era parte integrante do cotidiano. O cheiro predominante nessas ruas não era de uísque ou tabaco, mas sim uma mistura forte de poeira, suor, lama e detritos animais.
A lei do mais forte e o mito do xerife
A figura do xerife incorruptível é outra invenção que não correspondia à realidade da maioria desses assentamentos. No início, muitas cidades sequer possuíam polícia e a justiça ficava a cargo de vigilantes, grupos de cidadãos armados que puniam crimes com enforcamentos públicos e julgamentos sumários. Mesmo quando havia um representante da lei, muitos eram tão corruptos quanto os criminosos, estando muitas vezes a serviço dos donos de estabelecimentos locais.
Além disso, os famosos duelos ao meio-dia eram raríssimos. A violência real era traiçoeira, ocorrendo geralmente através de emboscadas, tiros pelas costas ou brigas de bar. Um estudo do historiador Robert Dykstra apontou que, embora a taxa de homicídios em locais como Abilene fosse alta, a violência era apenas mais visível e espetacular do que em grandes cidades do leste, como Nova York.
Saloons, doenças e o perigo constante
O coração social de qualquer uma das cidades do Velho Oeste era o Saloon. Muito mais do que um bar, esse estabelecimento funcionava como hotel, restaurante, casa de jogos e até ponto de correio. O escritor Oscar Wilde, ao visitar a região em 1882, descreveu esses locais como palcos da ganância humana. A rotina fora dali envolvia trabalho exaustivo em minas ou ferrovias, enquanto as mulheres, com poucas opções profissionais, muitas vezes acabavam trabalhando nesses ambientes hostis.
O perigo, porém, não vinha apenas das armas. A falta de água potável e o lixo nas ruas facilitavam epidemias de cólera, varíola e tuberculose. Em Deadwood, os cemitérios cresciam mais rápido do que a própria cidade. O risco de incêndio também era iminente, já que as construções de madeira podiam ser consumidas em poucas horas por uma vela mal apagada. Ainda assim, a esperança de enriquecer ou recomeçar a vida mantinha o fluxo de pessoas que buscavam, acima de tudo, a liberdade de um lugar sem sistemas rígidos de controle.

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